O Pirarucu ( Arapaima gigas ) á um peixe exclusivo da Bacia Amazônica e característico das águas calmas de suas várzeas. Vive em lagos e rios tributários, de águas claras, brancas e pretas ligeiramente alcalinas e com temperaturas que variam de 24° a 37°C, não sendo encontrado em zona de fortes correntezas e águas ricas em sedimentos.
A espécie apresenta características biológicas e ecológicas distintas: de grande porte, seus espécimes podem atingir até três metros de comprimento e 250 quilos, possui dois aparelhos respiratórios, as brânquias, para a respiração aquática e a bexiga natatória modificada, especializada para funcionar como pulmão, no exercício da respiração aérea, obrigatória; durante a seca os peixes formam casais, procuram ambientes calmos e preparam seus ninhos, reproduzindo durante a enchente; é papel do macho proteger a prole por cerca de seis meses. Os filhotes apresentam hábito gregário, e durante as primeiras semanas de vida, nadam sempre em tomo da cabeça do pai, que os mantém próximos à superficie, facilitando-lhes o exercício da respiração aérea.
Apesar de ser uma espécie resistente, essas características ecológicas e biológicas tomam o pirarucu bastante vulnerável à ação dos pescadores. Os cuidados com os ninhos, após as desovas expõem os reprodutores à fácil captura com malhadeiras ou à fisga com haste e arpão. Durante o longo período de cuidados parentais, a necessidade fisiológica de emergir para captar ar ocorre em intervalos menores, ocasião em que os peixes são arpoados. O abate dos machos, após as desovas, expõe os filhotes à predação por peixes carnívoros, especialmente as piranhas e a longa fase de imaturidade sexual (3-5 anos) propicia a captura de espécies juvenis. chamados “bodecos”, de peso variando entre 30 e 40 quilos, diminuindo o sucesso reprodutivo.
Com a intensificação da pesca comercial no Baixo e Médio Amazonas nas últimas três décadas, os estoques pesqueiros vêm sofrendo uma pressão cada vez mais intensa, gerando impacto profundo nas populações das principais espécies comerciais, e, no caso específico dos pirarucus, os dados da literatura, embora controversos, indicam uma tendência geral à sobrepesca, fato agravado pelas características biológicas da espécie que não favorecem uma recuperação rápida dos estoques.
As medidas legais de proteção ao pirarucu na Bacia Amazônica foram implementadas a partir de 1991, por meio da Portaria n? 480, de 3 de março de 1991, proibindo anualmente o exercício da pesca do pirarucu no período de 1? de dezembro a 31 de maio, correspondente ao tempo de desova e cuidados parentais. Em 1993 estabeleceu-se o tamanho mínimo de 1,0 (um metro) para a comercialização da manta ou posta seca (Portaria 014-N, de 15 de fevereiro de 1993) e finalmente, na Portaria n° 1 .534, de 20 de dezembro de 1993, estabeleceu-se o tamanho mínimo de 1,5 metros para a sua captura, visando sua exploração racional. impedindo, do ponto de vista legal, a captura de espécimes jovens, que ainda não reproduziram. Muito embora a legislação defina o tamanho mínimo da captura, a fiscalização é dificultada pelo fato do peixe ser comercializado principalmente salgado em mantas, impedindo assim a avaliação precisa do tamanho do animal.
Alimento tradicional entre as populações ribeirinhas, seu alto valor reside em seu grande porte e no excelente sabor de sua carne, notadamente quando beneficiada seca e salgada, em mantas, substitutivo do bacalhau. Praticamente desprovida de espinhas, de sua carne se preparam diversos e saborosos pratos regionais, entre eles o famoso “pirarucu de casaca”. Suas escamas são usadas como lixa de unha ou na confecção de ornamentos, e sua língua, óssea e áspera, é largamente utilizada para ralar o guaraná em bastão. Os ovos das fêmeas também são consumidos e a pele vem sendo objeto de estudos que visam sua utilização na produção de sapatos, bolsas e vestimentas.
M.Sc. Constantino Pedro de Alcântara Neto
Biólogo Ambiental-Ictiólogo
IBAMA/Projeto IARA/Santarém-PA