Manaus – Imagine um “rio voador” com vazão maior que a do São Francisco. Dentro dele, um avião “navegando” para recolher gotas de água que serão levadas para laboratórios de alta tecnologia. A descrição poderia ser parte de um roteiro de ficção científica, mas ocorre no Brasil. O projeto, chamado Rios Voadores, analisa o percurso do vapor d’água oriundo de árvores da Amazônia até virar chuva para o Centro-Sul do país.
Piloto do avião que viaja pelos rios voadores, o pesquisador suíço Gérard Moss apresentou o projeto durante a 61° Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC). Acusado por alguns cientistas de “banalizar ou vulgarizar” a ciência, Moss argumentou que a divulgação também é parte do processo de produção de conhecimento.
“A ciência precisa avançar, mas também precisa ser divulgada. E é preciso conectar o Brasil com as questões amazônicas”, defendeu.
Uma das metas do projeto é investigar como a redução da floresta pelo desmatamento e pelas mudanças climáticas pode influenciar o regime de chuvas no restante do país. De acordo com o professor Pedro Leite Dias, do Laboratório Nacional de Computação Científica (LNCC), o aumento da temperatura de 1 grau Celsius (°C) a 2,5 °C pode reduzir as chuvas em até 20%.
Pesquisador da Universidade de São Paulo, o especialista em análise isotópica Marcelo Moreira é um dos responsáveis pela identificação da “impressão digital” das moléculas de vapor d’água dos rios voadores para dizer se as gotículas capturadas pelo avião de Moss no interior de São Paulo vieram mesmo de árvores da Amazônia.
“Tenho certeza de que, se todos fôssemos cientes do valor de cada ecossistema, não estaríamos hoje discutindo se escolhemos as florestas ou derrubamos para pastos e plantação se soja”, criticou Moss.
Além da valorização dos serviços ambientais prestados pela Amazônia – o que reforça a ideia de que é economicamente vantajoso manter a floresta em pé – o projeto Rios Voadores tem colaborado de outra forma com a comunidade científica, à medida que se mostra uma nova forma de financiamento de pesquisas.
Patrocinado com recursos da Petrobras, o projeto conseguiu garantir verba e velocidade para as pesquisas relacionadas, segundo Dias Leite. “A articulação com o Gérard tornou viável experiências que custariam muito e levariam muito mais tempo. A questão do custo é crítica para a realização desse tipo de experimento. As parcerias institucionais são fundamentais.”
Luana Lourenço
Enviada Especial
Agencia Brasil